Discricionariedade indevida

O Informativo TCU nº 75 trouxe algumas questões especialmente ligadas a atos em que o administrador usou a discricionariedade indevidamente. Lembro que, em face ao princípio da legalidade, a discricionariedade administrativa é mitigada pelos limites estabelecidos pela lei. Em relação aos assuntos abordados por este informativo, é importante que o agente público sempre tenha em mente que seus atos não frustrem injustificadamente a competitividade e sejam motivados, pautados de razoabilidade.
Como é de praxe: o Informativo TCU nº 75 contém resumos de algumas decisões proferidas no período de 8 a 12/08/2011 relativas a licitações e contratos, e tem por finalidade facilitar o acompanhamento, pelo leitor, da jurisprudência do TCU quanto aos aspectos relevantes que envolvem o tema.
A seleção das decisões que constam do Informativo é feita pela Secretaria das Sessões e leva em consideração ao menos um dos seguintes fatores: ineditismo da deliberação, discussão no colegiado ou reiteração de entendimento importante. Os resumos apresentados no Informativo não são repositórios oficiais de jurisprudência.
Por entender que é um assunto bastante relevante e repetitivo, que interessa tanto a Administração Pública quanto aos administrados, iremos reproduzir o resumo além do título.
Plenário
Pregão para contratação de serviços: por constituir presunção relativa, suposta inexequibilidade de proposta comercial de licitante não autoriza imediata desclassificação, excetuando-se situação extremas nas quais a Administração Pública se veja diante de preços simbólicos, irrisórios ou de valor zeropreço baixo.
Representação trouxe ao conhecimento do Tribunal potenciais irregularidades no edital do Pregão Eletrônico nº 9/2011, conduzido pelo Ministério da Previdência Social – (MPS), no qual objetivou contratar empresa especializada na prestação de serviços de organização de eventos, incluindo as atividades de operacionalização, execução, acompanhamento e finalização dos mesmos, com abrangência nacional, em regime de empreitada por preço unitário. Para o relator, a controvérsia principal trazida aos autos cingiu-se à regra editalícia que levaria à desclassificação das propostas que apresentassem desconto superior a 30% do orçamento elaborado pelo Ministério da Previdência Social. Consoante o relator, após revisão do arcabouço legal das normas regentes do assunto, não haveria nenhum dispositivo que autorizaria o estabelecimento de critério de aceitabilidade de preço mínimo para o caso de serviços comuns. Todavia, a Instrução Normativa nº 2/2008 da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (IN/SLTI nº 2/2008) trataria da questão em seu art. 29, a qual deveria, então, ser interpretada a partir dos dispositivos legais de referência (inc. X do art. 40, § 3º do art. 44 e inc. II do art. 48, todos da Lei 8.666/1993). Nesse quadro, consignou que, apesar de o § 5º do art. 29 da IN/SLTI nº 2/2008 dar possibilidade de desclassificação imediata de propostas a partir da ocorrência das condições lá estabelecidas, “em licitação para contratação de serviços comuns, como é o caso, a Lei de Licitações não define critérios objetivos para aferição da exequibilidade das propostas”. Caberia, então, ao administrador público exercer tal tarefa com cautela, sob pena de eliminar propostas exequíveis que à primeira vista se mostrem inviáveis, em descompasso com a busca pela proposta mais vantajosa e, por consequência, com o princípio da economicidade”. Assim, exceto em situações extremas nas quais a instituição contratante se veja diante de preços simbólicos, irrisórios ou de valor zero, a teor do § 3º do art. 44 da Lei 8.666/1993, a norma não teria outorgado à comissão julgadora, ou ao pregoeiro, poder para desclassificar propostas, sem estar demonstrada, no procedimento licitatório, a incompatibilidade entre os custos dos insumos do proponente e os custos de mercado, bem como entre os seus coeficientes de produtividade e os necessários à execução do objeto. Destacou, ainda, que “embora a Lei não defina parâmetro do que seja irrisório ou simbólico, cabe ao intérprete firmar tal juízo no caso concreto, em atenção ao princípio da razoabilidade”, sendo certo que “uma proposta nessa condição há de apresentar preços deveras destoantes da realidade, em respeito à própria adjetivação utilizada pela norma, não se podendo afastar, de plano, por exemplo, propostas cujos preços representem pouco menos de 70% do valor orçado pela Administração”. Assim, a despeito das disposições constantes do § 5º do art. 29 da IN/SLTI nº 2/2008, propostas supostamente inexequíveis não poderiam ser desclassificadas de maneira imediata, excetuando-se as situações extremas previstas no § 3º do art. 44 da Lei 8.666/1993 (preços simbólicos, irrisórios ou de valor zero). Por conseguinte, além de outras irregularidades, por conta da adoção indevida de critério de desclassificação de propostas de várias licitantes, as quais não teriam tido sequer oportunidade para tentar evidenciar a factibilidade de suas propostas, votou o relator pela procedência da representação e por que se determinasse ao MPS, com relação ao Pregão Eletrônico nº 9/2001, a adoção de medidas com vistas à sua anulação, em face dos vícios de legalidade apurados, sem prejuízo, ainda, de se determinar ao órgão medidas corretivas para suas futuras licitações. Nos termos do voto do relator, o Plenário manifestou sua anuência. Precedentes citados: Acórdãos nos 559/2009, da 1ª Câmara, 697/2006 e 363/2007, ambos do Plenário. Acórdão n.º 2068/2011-Plenário, TC-015.709/2011-6, rel. Min. Augusto Nardes, 10.08.2011.
  • A não aferição do perfil dos profissionais indicados em substituição aos originalmente integrantes da equipe técnica apresentada por empresa contratada, a partir de licitação do tipo técnica e preço, constitui irregularidade, sujeitando o responsável pelo fato às sanções cabíveis. Acórdão n.º 2091/2011-Plenário, TC-018.910/2009-0, rel. Min. Aroldo Cedraz, 10.08.2011.
  • vitamins boyLicitação para aquisição de produtos de merenda escolar:
  1. No caso de exigência de amostra de produto, devem ser estabelecidos critérios objetivos, detalhadamente especificados, de apresentação e avaliação, bem como de julgamento técnico e de motivação das decisões relativas às amostras apresentadas (Acórdão n.º 2077/2011-Plenário, TC-004.835/2011-5, rel. Min.-Subst. Augusto Sherman Cavalcanti, 10.08.2011);
  2. Em regra, as aquisições por parte de instituições públicas devem ocorrer por itens, sendo que no caso de opção de aquisição por lotes a composição destes deve ter justificativa plausível (Acórdão n.º 2077/2011-Plenário, TC-004.835/2011-5, rel. Min.-Subst. Augusto Sherman Cavalcanti, 10.08.2011).
  • Para fins de configuração de ilicitude, basta a utilização indevida do benefício de desempate previsto no art. 44 da Lei Complementar 123/2006, destinado à empresa de pequeno porte ou microempresa, não sendo necessária a efetiva contratação para que seja declarada a inidoneidade da empresa. Acórdão n.º 2101/2011, TC-019.543/2010-7, rel. Min.-Subst. Marcos Bemquerer Costa, 10.08.2011.
  • Licitação para aquisição de produtos de merenda escolar: argumentos como a limitação de espaço para estocagem de alimentos ou o prazo de validade dos produtos perecíveis não impedem que seja utilizada a correta modalidade de licitação, desde que seja realizada a elaboração de cronograma de fornecimento, o qual deve integrar o instrumento convocatório do certame. Acórdão n.º 2109/2011, TC-011.886/2010-2, rel. Min.-Subst. André Luís de Carvalho, 10.08.2011.

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Um comentário:

Anônimo disse...

Especificamente quanto à aferição da inexequibilidade da proposta, sempre fui contra a fixação de um percentual de admissibilidade tal como no caso analisado pelo TCU. A razão seria a necessidade de aferir a exequibilidade da proposta em relação, estritamente, às condições da empresa proponente, que envolvem diversos aspectos de sua atuação no mercado. Desse modo, a inexequibilidade que autoriza a exclusão do certame deve ser documentalmente comprovada, não presumida. Contudo, a própria Lei de Licitações preferiu adotar um parâmetro mais objetivo para os casos de obra e serviço de engenharia licitados pelo tipo menor preço, conforme §1º do art. 48, reconhecendo as dificuldades que cecam essas decisões discricionárias. Adotou, visivelmente, dois pesos e duas medidas, o que não é, a meu ver, isento de críticas e parece contrariar os argumentos do TCU, ainda que fundamentem hipótese outra, que não a contratação de objetos de engenharia pelo tipo menor preço...

De qualquer sorte, todo ato discricionário deve ser motivado, o que significa necessidade de apontar os motivos, demonstrar sua suficiência e respaldá-los na ordem jurídica vigente. Infelizmente, essa regrinha de outro vem sendo esquecida, o que, além de configurar ilegalidade, é um grande equívoco estratégico para o próprio servidor que pratica o ato, atrapalhando uma eventual futura defesa perante o controle externo.

Abs!

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